domingo, 27 de junho de 2010

PRECONCEITO

O Perigo do Preconceito Brasileiro

Roberta Gonçalves Machado Vilaça
Mestre em Educação
Colégio Anglo de Itaúna

O tema preconceito é amplo na medida em que abrange diferentes aspectos: cultural, escolar, familiar. Também o ambiente, alimentação, habitação, trabalho, educação. E ainda os valores não materiais como a sensibilidade, a solidariedade, o respeito e o acolhimento. E em particular, no Brasil, sua problemática histórica, de diferenças marcantes. Todavia, a intenção aqui será a de trazer pequenas reflexões sobre o assunto.
Diante de que, em uma sociedade, onde o preconceito e a discriminação são demonstrados de formas cordiais, ou seja, fazem com que o negro viva “encurralado em uma autenticidade sem descanso”. (Frenette, 2000), onde a convivência é feita pela falsidade de tratarmos os diferentes como iguais, confundindo os sentimentos e as situações e construindo uma sociedade irreal.
Sociedade onde cada pessoa carrega sua história, sendo dita ou mostrada por sua aparência, no caso do negro, sua marca histórica nos é imposta pela sua pele. Devido a isso, não possui a opção de poder omitir o que lhe faz ser discriminado, enquanto um judeu “se quiser, pode abdicar de suas crenças” (Frenette, 2000), possuindo assim momentos de trégua em sua caminhada, sem ser alvo da falsa convivência cordial. Essa convivência cordial, ou seja, amistosa da sociedade brasileira diante dos negros, se transforma “em desigualdade através dos processos sutis e complexos, presentes em nosso cotidiano”. (Candau, 2003), o qual nos impede de ver no negro algo que fosse além da cor de sua pele. Com essa atitude fortalecemos a exclusão, a qual faz as pessoas serem eliminadas de seus direitos primários, educação, moradia, trabalho. Simplesmente pela nossa omissão diante do preconceito e da nossa falta de respeito com o outro, nesse caso o negro.
Para conviver de forma mais saudável dentro dessa realidade o negro deve possuir uma “visão realista da sua condição.” (Frenette, 2000), sem medo de demonstrar sua história e ser quem é, um negro, dentro de uma sociedade que possui o racismo imbuído na cultura e disfarçado na convivência cotidiana.
Esse processo nos faz pensar sobre o assunto e questionar os motivos que envolvem o procedimento de um preconceito camuflado na convivência entre os homens, em particular dentro da sociedade brasileira.
Não precisamos nos distanciar muito para verificarmos essa realidade. Perceba quantas vezes nos deparamos com perguntas simples como essa. Você é racista? Após um breve espaço de tempo, respondemos com indignação, não! Porém, logo após, nos remetem outra pergunta. Você se casaria com um negro? Bom, nesse momento nos deparamos com o nosso preconceito, o qual foi camuflado na primeira resposta sutilmente, pois ele está “profundamente arraigado no senso comum social e nele se cristalizam” (Candau, 2003), de tal forma que fica difícil identificar os verdadeiros sentimentos diante dos fatos.
Então, como poderemos perceber se estamos realmente sendo sutis em nossos procedimentos de preconceito? Se “a incompreensão dos sentimentos que há por trás dessas sensações inviabiliza, o aparecimento de relações raciais sadias”? (Frenette, 2000)
Para percebermos essa particularidade amistosa, será necessário uma revolução interior, uma mudança de pensamento perante o próximo, uma atitude de mudança cultural, diante de que “os preconceitos estão enraizados em todas as culturas, balizando as relações que cada uma delas estabelece com as outras e muitas vezes justificando o tratamento desigual e a discriminação de indivíduos e grupos”. (Candau, 2003)
Esse mecanismo nos faz distanciar do conhecimento, pois esse é capaz de transformar situações de desconforto em compreensão da realidade, a qual o preconceituoso não aceita, pois, ele segue regras impostas e o pior se julga certo. Como um covarde se esconde atrás da fala de que gosta de tudo muito claro, e sempre possui uma explicação para seus atos de discriminação, já olha e rotula cada pessoa sem se preocupar com a bagagem histórica que ela carrega. “ um comportamento dissimulado; bando de cegos por opção, fingindo não ver o que salta aos olhos.” (Frenette, 2000)
Para começarmos a mudar esse quadro, seria necessário conhecermos nossos preconceitos sem máscaras, saber quais os enraizamentos que nos foram feitos durante nossa formação, os preconceitos que foram enraizados no seio familiar e fortalecidos na nossa caminhada escolar e grupos sociais dos quais fazemos parte.
Esses podem ter nos transformado em seres sem sensibilidade, e assim nos fazem viver com as diferenças sem enxergá-las. Construíram dessa forma uma convivência de “simulação de uma igualdade entre diferentes” (Frenette, 2000) que é a base sobre a qual se assenta a doce particularidade da sociedade brasileira, uma convivência amistosa, hipócrita.
E quando tomamos a decisão de que nos conhecendo melhor passaremos a ser crítico em nossas atitudes, desmontamos essa irrealidade social, isolamos em nossa mente os “componentes cancerosos de” (Frenette, 2000) uma visão de mundo, na tentativa de se recuperar como pessoa.
Deixamos de ser crítico somente com a atitude do outro, pois, conseguimos ver que ele possui uma história da qual não fizemos parte, a qual não nos cabe mudar, pois apenas em nossa história podemos realizar mudanças, e, para isso, precisamos utilizar a conscientização. Esta é a força de toda mudança,pois nos possibilita sermos politizados e conhecedores da realidade vivida, isso está ao nosso alcance, quando estamos abertos ao conhecimento e a vontade de mudar.
Sabemos que essa mudança não é fácil, porque os preconceitos são parte da nossa formação, e, devido a isso, é “extremamente difícil de erradicá-los do pensamento, pois a perspectiva crítica exige mais esforço do que a simples aceitação de idéias falsas, mas as quais estamos acostumados e que nos favorecem”. (apud, Candau, 2003), na sociedade brasileira.
Estarmos acostumados e protegidos pelo preconceito, que nos faz trilhar um caminho perigoso, o da leviandade, com o qual praticamos atos de discriminações, os quais podem ser identificados, através da observação dos tratamentos diferenciados que proporcionamos as pessoas em nosso cotidiano.
Porém, não devemos nos proteger de nossa crítica pessoal dizendo que nosso ato é de percepção, fazendo assim distinção entre pessoas com cordialidade, velha particularidade brasileira. Devemos sim, ter a ousadia de conhecer o outro e de nos colocarmos em seu contexto, o qual “na sociedade brasileira, é a problemática da discriminação que tem profundas raízes históricas e uma forte relação com os processos de exclusão [...]” (Candau,2003), sendo essa uma constante no cotidiano escolar. Pois, “o ambiente escolar pode reproduzir imagens negativas e preconceituosas.” (Candau, 2003).
Em uma sala de aula é comum se ouvir de professores que um aluno é esforçado e possui bom comportamento ou apenas são esforçados. Não valorizam a inteligência do aluno, não destacam suas habilidades como a liderança ou sua sensibilidade, incutindo nesse comportamento preconceitos, os quais serão levados como verdades pelos alunos, que são pessoas de várias etnias.
Essa verdade, pode fazer com que a pessoa deixe de ser um profissional seguro de suas ações. Na escola convivemos com vários tipos de discriminação, o qual gostaria de ressaltar o preconceito racial. Porque a “questão racial não é exclusiva dos negros, ela é da população brasileira” (apud,Candau,2003), do que adianta preocuparmos com a valorização de uma etnia sem se preocupar em fazer com que as demais reflitam e repensem em suas ações? Aprendam a ser críticos em seus pensamentos e atitudes?
Ninguém diz “para o filho que ele deve discriminar o negro, mas a forma como se trata um empregado, as piadas, os ditados e outros gestos influem na educação” (Candau, 2003) em especial na educação brasileira na qual há grande dificuldade de se trabalhar o preconceito racial. Esse, “ está ancorado na existência de um senso comum que, em geral, não reconhece a presença do racismo entre nós e quando admite a sua realidade, sempre a situa nos outros” (Candau,2003), tendo o brasileiro dificuldade de reconhecer suas ações e de se enxergar como preconceituoso. Refletir sobre as diferenças não faz parte da vivência do brasileiro, já habituado com a particularidade amistosa de convivência.
Entretanto, devo ressaltar que a escola, embora reflita desigualdades estruturais, “não se resume a um mero instrumento de reprodução, uma vez que ela possui autonomia em relação à sociedade na qual está inserida”. (Candau,2003)
Acredito que a escola possa reproduzir conhecimentos, os quais ajudam a conquista da cidadania, cujos os direitos primários retirados pelos preconceitos, possam ser conquistados com dignidade, pois vivemos em uma “guerrilha cotidiana cheia de armadilhas, em que a maioria vai à luta sob camuflagens. Na identificação do inimigo, porque ele existe, a única arma realmente eficiente é a sensibilidade, braço direito – e desarmado – do amor.” (Frenette, 2000), assim nos conhecemos sem máscaras e podemos construir uma sociedade melhor para se viver.
Portanto, devemos refletir, usar a capacidade de pensar, para avaliar as próprias atitudes e ter coragem de mudar, construindo o respeito pelas diferenças individuais, sem, entretanto, se esquecer da importância da convivência que traz ganhos de bem estar e aprendizagem contínua em qualquer sociedade.









Referencial Bibliográfico
CANDAU, Vera Maria Somos todos iguais? Escola, discriminação e educação em direitos humanos. Rio de Janeiro: DPFA, 2003
FRENETTE, Marco. Preto e Branco: a importância da cor da pele. São Paulo: P. Brasil, 2000.
_________________ O fato fundador. São Paulo: P. Brasil, 2000.
_________________ A aventura do homem branco. São Paulo: P. Brasil, 2000.
_________________ A descoberta do ogro. São Paulo: P. Brasil, 2000.
_________________ A queda. São Paulo: P. Brasil, 2000.
_________________ Vidas brancas. São Paulo: P. Brasil, 2000.

Filme “Olhos azuis” (GNT, 1995,1:37h)

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